quinta-feira, 17 de março de 2011

A Prostituta do Meu Bairro

Todos os dias, entre às 20 e 23h eu vejo aquela mulher. Às vezes cansada de tanto esperar. Outras tantas feliz por esperar. Mas, desde que eu me conheço por gente, aquela moça fica ali na praça da frente de casa.

            Um dia desses tive a ideia de conhecê-la. Fui até o lugar que ela sempre ficava e esperei o sol cair para ela aparecer. Apesar de não parecer uma mulher tão linda, na maioria dos dias da semana, principalmente sexta-feira, dia que eu a fui procurar, o movimento era grande.

            20h53min. Ela chega exatamente neste horário. Com seu salto alto, seus olhos transbordando tristeza e sua voz enrouquecida que diz:

            - Seu moço, são 50 reais, se for aqui, 60 reais se quiser fazer na tua casa e 40 reais no motel.

            E eu, assustado com a sua objetividade, falei:

            - Eu só tenho 50 reais, tens troco?

            - Não. – Ela responde em tom ríspido.
           
            - Então vamos fazer aqui mesmo. – Disse eu, tentando colocar medo nela.

            Em vão, logicamente. Eu não queria transar com ela. Ainda mais ali, na esquina da praça da minha rua. Após explicar isso a ela, disse que eu queria alguém para conversar. Acho que ninguém a valorizou tanto quanto eu, apenas com estas palavras. Aquela mulher se comoveu. Eu ganhei a prostituta do meu bairro, pelo menos por uma noite.

            - Então – eu comecei – eu moro aqui desde o primeiro dia da minha vida e sempre te vi aqui, faça calor ou frio, seja feriado, fim de semana. Por que tu vens para cá todas as noites?

            - Eu amo meu marido e minhas filhas, por isso eu venho.

            - Como assim? Tu tens um marido e filhas?

            - Sim, eu tenho um marido e duas filhas. Uma de 17 anos e outra de 09 anos.

            - Então o que fazes aqui? Por que não está cuidando das filhas? Vivendo com o teu marido?

            - A minha filha mais velha tem uma doença muito rara, eu nem sei o nome dela, que afeta os ossos. Ou seja, ela tem muita dificuldade para caminhar. Não consegue tomar banho sozinha, não consegue se virar sozinha, infelizmente. Meu marido, que graças a Deus está bem, a ajuda com isso. Ele não sabe o que eu faço, mas se eu não fizesse isso, ele morreria de fome. Ele foi preso duas vezes, não tem nem o primeiro grau completo, ninguém o quer para trabalho algum.

            - Nossa, eu acho que pensava muita coisa errada a seu respeito, desculpe-me. Mesmo que tu não saibas. Eu sempre fico observando teus passos da janela do meu quarto.

            - É, tudo bem, as pessoas não sabem da minha vida e me julgam por isso, ao menos tu não quiseste me espancar nem algo do tipo.

            Nesta hora ela levanta seu braço para arrumar a franja e eu vejo seu cotovelo todo esfolado, logicamente era de arrastá-los na brita, andando de quatro, como se fosse um animal, mas eu não quis dizer nada.

            - E quanto tu tira por noite?

            - Depende do movimento, mas geralmente entre 50 e 200 reais.

            - Te arrepende do que faz?

            - Não, eu me arrependo das escolhas que eu fiz. Mas não me arrependo de fazer isso, pois é tudo por amor as minhas filhas e meu marido. Às vezes é humilhante passar por isso, mas poder ver a minha filha mais nova crescer, a maior, aos poucos, melhorar e meu marido, mesmo que em casa, ajudando-as, isso não tem preço.

            - Eu queria te ajudar, tem como?

            - Sim, tem. Venha aqui de vez em quando, por favor. Eu preciso de alguém para conversar.

            - Sim, eu vou. Pode ter certeza. Já é quase meia-noite, preciso ir pra casa, amanhã eu tenho que acordar cedo, eu tenho aula. Infelizmente amanhã será um sábado letivo.

            - Tudo bem, obrigado por tudo. Eu também preciso seguir a minha vida, tem um carro estacionado ali, tchau.

            - Espere um pouco – disse eu – tome aqui seu dinheiro. Aqui são 50 reais, certo?

            - Obrigado, mesmo.

            - Tchau, tchau. Até mais.

            - Até.

            Cheguei à minha casa, fui para a janela do meu quarto, procurando-a. Ela estava conversando com alguém. Ouço aquela voz dizendo:

            - Meu marido, minhas filhas, vocês estão bem?

            E o barulho de dois tiros a queima roupa.

            Fim de vida. Fim de história. Fim de palavras.